A importância da Lei das Antenas
Por Lia Ribeiro Dias*
A suspensão da comercialização de linhas celulares em Porto Alegre (RS), por determinação do Procon, no dia 16 de julho, mostra uma somatória de erros que envolvem a telefonia celular no Brasil e a necessidade urgente de o país contar com uma lei federal que discipline a instalação de estações radiobase nas cidades brasileiras. Em debate no Executivo, o projeto da chamada Lei das Antenas deve ser encaminhado pelo governo ao Congresso Nacional, neste semestre.
Com quase duas centenas de legislações municipais que tratam do tema, que é de competência federal por envolver a política de telecomunicações, o país foi construindo uma armadilha que prejudica os próprios usuários. Bem intencionadas, mas nem sempre com fundamentações técnicas corretas, muitas dessas legislações, elaboradas para proteger os cidadãos dos efeitos nocivos que poderiam ser provocados pela radiação das antenas, impedem a prestação de um serviço de telefonia celular de qualidade. É o caso de Porto Alegre, onde as restrições à instalação de antenas, dispostas em uma lei considerada a mais restritiva do país, levaram a uma situação de baixa qualidade da cobertura. Mesmo em bairros centrais, há buracos na cobertura que impedem a transmissão do sinal. Em suma, em 500 pontos, segundo o levantamento feito pela seção gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil o celular não pega.
Essas legislações surgiram no início dos anos 2000, a partir do debate, ainda em pauta, sobre os possíveis efeitos nocivos da radiação das antenas sobre a saúde dos moradores de seu entorno e mesmo sobre possíveis efeitos da radiação do aparelho celular na saúde de seu usuário. Todos os estudos mundiais sobre o assunto, pelo menos até agora, não comprovaram essa hipótese. Ao temor das consequências de uma possível nova epidemia, a epidemia do celular, de dimensões imprevisíveis somaram-se outros interesses, como o medo da desvalorização dos imóveis próximos à estação radiobase.
E com base nesses medos e muita pouca racionalidade – proíbe-se instalação de antenas perto de escolas e hospitais, quando a potência da radiação aumenta à medida em que o sinal se distância da estação radiobase -- os legisladores foram definindo as regras de instalação de antenas.
Mas a culpa não é só dos legisladores municipais. Falhou a Anatel que nunca se preocupou em fazer uma campanha nacional de esclarecimento, em articulação com as associações de municípios. Falhou o governo federal que se omitiu totalmente em propor uma regulamentação adequada e que só começou a tratar seriamente do assunto quando problema se agigantou, com a massificação do uso de celular no país. E falharam as operadoras, muito mais preocupadas em aumentar sua base de clientes do que em encontrar soluções para prestar um serviço de qualidade. As empresas passaram os últimos anos apenas reclamando das legislações restritivas, mas só recentemente traçaram uma estratégia, por meio do SindiTelebrasil, para enfrentar o problema, com reuniões de esclarecimento com entidades de municípios, câmaras municipais e executivos municipais.
A decisão radical do Procon de Porto Alegre, acionado pela OAB gaúcha, é também resultado das deficiências do serviço celular prestado pelas operadoras. Mesmo que boa parte dos problemas enfrentados na cidade decorram da legislação restritiva – existem cem pedidos de instalação de antenas na cidade não deferidos pelos órgãos municipais --, as entidades da sociedade civil e as autoridades municipais têm resistência em aceitar os argumentos técnicos porque falta credibilidade às operadoras. É bem verdade que não é possível prestar um serviço para uma base de 250 milhões de usuários sem um volume grande de reclamações, dada a magnitude dos números envolvidos. Mas com todos os regulamentos de qualidade, multas da Anatel e termos de conduta assinados, as operadoras não resolveram uma questão elementar: o atendimento ao cliente. Quem já teve que ligar para um call center sabe como é. Agora, o atendimento automático é rápido, mas o cliente acumula, para a solução de um problema, uma fileira de protocolos. E a solução continua demorando.
O caso de Porto Alegre é emblemático. De um lado a sociedade, que quer um bom serviço, mas não quer as antenas: de outro as operadoras, que justificam a baixa qualidade do serviço em decorrência de legislações restritivas, quando esta não é a única causa, embora seja relevante. Em muitos casos falta investimento na rede e a qualidade é uma meta ainda distante.
A gravidade da decisão do Procon também alertou as autoridades locais para a necessidade de rever a legislação municipal e de avaliar, com celeridade, os pedidos de instalação de antenas, sob pena de a capital gaucha vir a enfrentar um “caladão” na telefonia móvel. E mais: de não contar com a rede de quarta geração, que vai exigir um número ainda maior de antenas, por usar freqüência mais alta.
Certamente, o episódio de Porto Alegre vai acelerar o envio da Lei das Antenas para o Congresso e incentivar os parlamentares a dar atenção ao seu debate e tramitação. Este vai ser um passo importante para a melhoria da prestação do serviço de telefonia móvel no país. Mas este passo precisa ser acompanhado de uma fiscalização mais rigorosa da Anatel – a partir de setembro, as celulares vão ter de cumprir as metas de qualidade no serviço de dados – e de uma mudança de postura das operadoras no atendimento a seus clientes.
Afinal, celular hoje não é só um telefone. É ferramenta de trabalho, de comunicação, de interação, de geração de renda, de acesso a serviços públicos e bancários. Ou seja, é um serviço essenLia Ribeiro Dias é diretora editorial da Momento Editorial. Seu nome, trabalho e opiniões são referências no mercado editorial especializado e, principalmente, nos segmentos de informática e telecomunicações, nos quais desenvolve, há 28 anos, a sua atuação como jornalista.cial.
*Lia Ribeiro Dias é diretora editorial da Momento Editorial. Seu nome, trabalho e opiniões são referências no mercado editorial especializado e, principalmente, nos segmentos de informática e telecomunicações, nos quais desenvolve, há 28 anos, a sua atuação como jornalista.