A globalização do protesto
Para socióloga, os levantes que vêm pipocando pelo mundo nascem sob a lógica universal da exclusão
Entrevista: Saskia Sassen
Protestos em Londres |
Socióloga Saskia Sassen |
Saskia dá aula na Universidade Colúmbia, em Nova York, e é autora de Sociologia da Globalização (Artmed) e Global City (Princeton University Press), entre outros. Nesta entrevista ao Aliás, a socióloga põe em perspectiva a miríade de protestos que pipocou só neste ano; e explica por que os americanos, que perderam suas casas com a crise e hoje moram em tendas, também não se revoltam. "A classe média americana está em choque." Por fim, Saskia acrescenta que é preciso abandonar velhos paradigmas e atentar para o fato de que nos últimos anos o mundo testemunhou o nascimento de uma nova classe de atores históricos, e eles tomaram as ruas.
Um aspecto comum às manifestações é a presença marcante de jovens rostos insatisfeitos. Que novas narrativas da globalização essa geração ‘desobediente’ está escrevendo nas ruas de Londres, Damasco, Cairo, Atenas, Benghazi, Madri, Tel-Aviv, Santiago?
Protestos no Irã |
Em Tel-Aviv, as pessoas arrastaram sofás para o meio-fio a fim de protestar. No Cairo e em Madri, acamparam nas praças. Em Atenas, vandalizaram a infraestrutura da cidade e em Londres a queimaram. O que está por trás dessas intervenções no cenário urbano?
Em certa medida, os manifestantes fazem parte do contexto de lutas contra a especulação imobiliária dos anos 80, que resultaram na expulsão dos moradores tradicionais de áreas da cidade. Em um plano mais amplo, são lutas pelo direito à cidade. Manifestações de rua fazem parte de nossa história. Os levantes no mundo árabe, as revoltas em bairros da China, os piqueteiros batendo panelas na América Latina - são todos veículos de reivindicação social e política. Pela primeira vez estão marchando em Tel-Aviv, não para derrubar o governo, mas para pedir acesso a moradia, emprego. Esses movimentos buscam participação no poder, não só protestar contra ele.
As manifestações parecem distanciadas da política partidária tradicional. Elas se concretizam nas ruas, com líderes surgidos no Facebook. É o próprio establishment político que está sendo questionado?
Protestos na Itália |
Há um limite para o tanto de renovação que o establishment político pode fazer. Mas um objetivo fundamental deve ser garantir que os menos favorecidos se sintam ouvidos. Sem voz política, os instrumentos de comunicação de que dispõem podem facilmente levar ao tumulto. Vivemos numa situação de extremos. Temos uma vasta fome em partes do mundo, ao passo que temos também jovens com educação que não estão aceitando o fato de que terão uma vida pior que a dos pais. Isso me faz crer que chegamos a um tipping point, um momento de mudança.
E o que nos levou a esse ponto?
A era global empobreceu a classe média e agravou a situação dos pobres. Ao longo de 30 anos houve perda de renda de metade da população mundial e tamanha concentração de riqueza no topo que simplesmente chegamos ao limite. É a explosão disso que estamos vendo em nossas cidades.
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