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segunda-feira, 18 de julho de 2011

Veneno à nossa mesa: Agrointoxicação e ‘vedação ocular’, artigo de Bruno Peron

 Veneno à nossa mesa: Agrointoxicação e ‘vedação ocular’
Artigo de Bruno Peron
Você desconfia de que parte dos alimentos que come podem acarretar danos graves e irreversíveis à saúde devido aos resíduos de agrotóxicos e fertilizantes químicos? 
Especialistas advertem que o Brasil é um dos países mais agrointoxicados e que sua população padece de insegurança alimentar, uma vez que está contaminada mais de metade das cenouras, pimentões, uvas, pepinos e morangos que consumimos. 
Ganhou notoriedade o tema da insegurança alimentar quando se temia a falta de alimentos para os brasileiros devido ao incremento das exportações. Agrega-se que, além do pouco remanescente, ainda compõem a mesa itens de procedência e qualidade duvidosas. 
O Programa de Análise de Resíduos Agrotóxicos em Alimentos (PARA), criado em 2001 no âmbito da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), monitora o nível de agrotóxicos nos alimentos e elabora relatórios, cujas revelações são assustadoras e escabrosas. 
A agência encontrou metamidofós em morango e alface, embora o pesticida seja proibido nestas culturas. Coíbem-se alhures certas substâncias químicas, como acefato, endossulfam e metamidofós, enquanto se as aplica irregularmente no Brasil em cultivos de alface, arroz, batata, laranja, tomate porque falta fiscalização, por um lado, e ética dos produtores, por outro. 
Mancomunemos, leitor e benfeitor, na tarefa de ab-rogar as mazelas deste país e transformá-lo num espaço geográfico de atitudes sérias, soberanas e eticamente responsáveis. 
O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Agrícola informou que os cultivos brasileiros receberam mais de um bilhão de litros de pesticidas em 2010. Este crime ambiental e sanitário, não obstante, é tido como apenas um número que contribui para o “êxito” da economia nacional e do setor produtivo primário. 
Os patrocinadores deste infortúnio raras vezes comentam sobre os riscos de exposição direta dos trabalhadores rurais aos venenos lançados sobre as plantações ou a incidência de câncer e outras doenças nos consumidores destes produtos, cujos sintomas não brotam de imediato e dificultam o reconhecimento da empresa causadora dos danos humanos. 
Indenização aos enfermos? Quem paga o prejuízo? Estas empresas auferem vantagens que nenhum micro-empreendedor brasileiro jamais sonhou. Sobra-nos a dívida social pelo atendimento hospitalar e psicológico às vítimas envenenadas. 
De valores: o mercado mundial de praguicidas movimenta 48 bilhões de dólares e está concentrado em poucas empresas, como Basf, Bayer, Nufarm, Dupont, Dow AgroSciences, Syngenta, e Monsanto. Só no Brasil são 7,1 bilhões de dólares, e nos Estados Unidos, 6,6 bilhões. 
Algumas destas empresas transnacionais oferecem programas concorridos de estágios e “trainees” a brasileiros cursantes ou recém-egressados das universidades. O sonho do bom emprego e o alto salário, porém, requer uma faixa de vedação ocular aos abusos e crimes que o capital estrangeiro comete contra o experimental e vulnerável Brasil. 
Como paroxismo do absurdo e denúncia por pesquisadores probos, os fabricantes de agrotóxicos controlam o mercado ao vender as sementes que só se desenvolvem plenamente com o uso de pesticidas, fertilizantes e aditivos que as mesmas empresas proveem. Os produtores rurais, deste modo, amarram-se aos fornecedores monopólicos por uma espécie de relação comercial obrigatória, como a indústria do tabaco no Rio Grande do Sul. 
A herança agrícola (intensificada pela Lei de Terras de 1850, que leiloou nossos solos aos imigrantes europeus atraídos pelo fim da escravidão), o fetiche das notícias economicistas, e o financiamento privado de campanhas para cargos políticos eletivos contribuíram para que saísse um vencedor do certame entre dois modelos agrícolas: o cultivo familiar em porções diminutas de terras e o agronegócio latifundiário exportador. 
O governo brasileiro optou pelo modelo nefasto do agronegócio latifundiário exportador há algumas décadas, enquanto objurga o desenvolvimento dos pequenos produtores, e concede às empresas transnacionais isenções fiscais, investimentos infraestruturais e respaldo jurídico. 
Sabemos quanta burocracia um empreendedor pequeno e vernáculo enfrenta para obter qualquer um destes benefícios. A ele lhe cabe, ademais, todo o rigor da lei que protege os brasileiros dos próprios brasileiros, mas escancara o país ao exterior. 
Receie as frutas e as verduras mais bonitas no supermercado e no varejão porque são as que mais se contaminam com emprego de agrotóxicos e fertilizantes químicos. 
Os alimentos de nossas mesas estão em questionamento pela origem duvidosa. Convido os agrointoxicadores a que prestem conta dos danos ambientais e sanitários que provocam. 
O preço do desinteresse da população brasileira nas causas públicas poderá ser muito caro. 
* Colaboração de Bruno Peron, mestre em Estudos Latino-americanos, para o EcoDebate
Fonte: REDE Os Verdes/via e-mail

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